Máscaras Larvárias


Máscaras larvárias, a metamorfose corporal.

Descobertas nos anos 60 no carnaval da Basel, na Suíça, as máscaras larvárias são formas simplificadas da figura humana: redondas, pontudas, curvas, onde o nariz tem uma grande importância e dirige toda a face. São geralmente assimétricas, para permitirem diferentes nuances, grandes, brancas, com a aparência de rostos ainda inacabados.

São bastante elaboradas, finas em seus detalhes, suscitam movimentos menores, mais sutis. Expressam sentimentos mais complexos, evidentes em seus traços, compondo, por exemplo, personagens do tipo o "raivoso", o "inteligente", o "narcisista", o "medroso", etc. Permitem um jogo amplo, simples, elementar e altamente poético. Com ela o ator busca um tipo de movimento correspondente a máscara, com uma dinâmica e ritmo próprio.

Larval Masks by Herr Zingg (Basel-CH)Podemos enveredar por três caminhos pedagógicos com esta máscara. Podemos trabalhá-la em situações mais caricatas, com foco em situações e personagens, no universo de desenhos animados. Podemos colocá-las em situações realistas ou absurdas, com ou sem a utilização de figurinos. Num segundo momento pode-se buscar um “portar” animalesco, associado aos movimentos e gestos dos animais. Um terceiro modo é trabalhar os impulsos internos, retirando a visão por trás da máscara. Ao fechar os olhos, atrás da máscara, o ator para de racionalizar e começa a jogar de forma intuitiva através dos seus outros sentidos. Desta forma pode explorar o espaço com maior potencialidade corporal e se predispõe perceptivamente ao jogo cênico. Isto se explica, porque a visão do mundo como a conhecemos foi construída através do tempo. A perspectiva, sombra, luz e as cores interferem em nossa percepção.

Lotto1 afirma, [...] como Berkeley diz, nós não temos acesso direto ao nosso mundo físico, a não ser através de nossos sentidos. E a luz que entra em nossos olhos é determinada por múltiplas variantes em nosso mundo -- não só as cores dos objetos, mas também a cor da iluminação dos objetos, e a cor do espaço entre nós e esses objetos. Você altera qualquer um destes parâmetros, e você mudará a cor da luz que entra no seu olho. Isso é um grande problema porque significa que a mesma imagem pode ter uma infinidade de fontes possíveis no mundo real.

Neste processo de descobrimento do corpo expressivo, a percepção tem uma importância ímpar para o ator, tanto do seu corpo como do espaço. Quando recebemos um estímulo do meio, eles são captados pelos órgãos sensoriais e interpretados a partir de nossa subjetividade e experiências.

Para LINARES (2010:150) com as máscaras larvárias, a resposta do espectador não é plenamente recebida pelo ator por meio do seu contato visual que, como vimos, é muito reduzido. Sua percepção sensorial deve se manter preparada no nível de sensibilidade mais aguçado, em estado de prontidão, para receber a resposta do sucesso (ou do insucesso) das suas ações a partir das diversas formas de manifestação, muitas vezes, caracterizadas pela extrema atenção, vibração, expectativa, alegria etc., que emanam da platéia. É neste sentido que o espectador se torna parceiro e guia do estudante/ator, orientando-o e conscientizando-o, sem saber, no caminho que o conduz à eficácia da ação cênica.

Considerada a segunda máscara pedagógica, quem a utiliza pela primeira vez as máscaras larvárias, experimentará a sensação de estar dentro de um casulo e, em consequência dos pequenos orifícios da máscara e se orientará pela luz frontal que ilumina a cena para assim poder manter-se de frente para a platéia. Quem a utiliza vai ganhando com o tempo uma “inteligência” para o jogo cênico e um repertório de novas situações.

Enquanto ensaia seus primeiros movimentos físicos e se prepara para dar seus passos iniciais, mesmo que a princípio sejam um pouco desajeitados, nasce um corpo que, à medida que se vai definindo em seus contornos corporais, procura compreender o espaço, guiado pela curiosidade dos seus sentidos, em estado de alerta e se utiliza desta escuta como uma forma de sobrevivência. O estudante explora com interesse o novo e, assim, deixando-se conduzir pela máscara, descobre os principais impulsos internos para agir. Em pouco tempo seu corpo-máscara já está basicamente configurado para começar a se manifestar com alguma organicidade e vontade particular. (LINARES, 2010:123).

               

O trabalho com as máscaras larvárias “concede” ao ator um caminho da sensibilidade com o parceiro no jogo e com o espaço em que está inserido. O corpo começa a se guiar pelos impulsos internos, deixa-se moldar com a forma, deixa-se entrar na forma. É o início da expressividade, da corporeidade do ator, é entrar no mundo de imaginação com um número infinito de possibilidades.

1  Especializado nos campos da ilusão de óptica, percepção e padrões, Beau Lotto é o criador do estúdio Lottolab, um centro de pesquisa em ciência, design e arte localizado em Londres.  http://www.lottolab.org



REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

LECOQ, Jacques. O Corpo Poético. São Paulo: SENAC, 2010.
LINARES, Fernando J. J. A máscara como segunda natureza do ator: o treinamento do
ator como uma “técnica em ação”. Belo Horizonte: Tese-Mestrado, UFMG, 2010.




Sobre o núcleo

Desde setembro de 2008, o Núcleo de Máscara da ELT trabalha de modo colaborativo na pesquisa da linguagem da máscara, sob os aspectos teóricos, estéticos, históricos, geográficos e culturais. O trabalho parte da prática, que sempre tem como fio condutor o jogo teatral.
De uma forma bem aberta, investiga as diversas máscaras existentes, suas linhas, seu jogo, suas regras e dramaturgia. Confeccioná-las, experimentá-las, portá-las e, a partir destas experiências, criar outras.

Coordenação: Cuca Bolaffi - formada pela L'École Internationale de Théâtre Jacques Lecoq (Paris), com especialização na linguagem da máscara, atriz, diretora e mestra da Escola Livre de Teatro.

NÚCLEO DE MÁSCARAS ELT

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(Próxima a estação de trem Prefeito Saladino)

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